O Brasil está na lista da Organização Mundial da Saúde (OMS) que inclui os 20 países com maior incidência de tuberculose e que, juntos, correspondem a 84% dos casos no mundo. Com 84 mil registros estimados em 2015, o País ocupa o 20º lugar nesse ranking, segundo o documento Global Tuberculosis Report 2016 (veja tabela abaixo).

De acordo com a professora e médica da Fiocruz Margareth Dalcolmo, também membro da Câmara Técnica do CFM criada este ano para discussão sobre tuberculose no Brasil, os avanços registrados no País foram notóios, mas precisariam ter ocor rido em velocidade maior para que ele pudesse sair do ranking da OMS.
Dados do Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde apontam que, em 2015, o Brasil atingiu a meta proposta nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio para o coe ciente de incidência de tuberculose. Esse indicador passou de 38,7, em 2006, para 30,9 por 100 mil habitantes, nove anos depois, o que corresponde a uma redução de 20,2%.

Membro de instâncias da OMS, do Banco Mundial e do Ministério da Saúde dedicadas ao tema, Dalcolmo explica, no entanto, que, para atingir as novas metas da OMS, a velocidade de queda no número de casos deveria estar em 10% de redução ao ano. Hoje, esse percentual é menor que 3%. Isso explica por que ainda estamos na lista de países que concentram o maior número de casos.

Uma das principais causas de morbidade e mortalidade relacionadas a doençaas infecciosas em países em desenvolvimento, a tuberculose é hoje um desafio epidemiológico e de política pública.

Alvo de uma meta ambiciosa da OMS e de outros organismos internacionais, a de ser erradicada até 2035, a doençaa irrompe como um dos maiores desa os de saúde pública dos próximos anos no Brasil e em pa?ses que concentram os maiores números de casos no globo.

  

Incidência de tuberculose no mundo

estimativa OMS 2016-2020*

 

País

População

Incidência em milhares

Percentual

Índia

1.310.000

2.840

27,3%

Indonésia

258.000

1.020

9,8%

China

1.380.000

918

8,8%

Nigéria

182.000

586

5,6%

Paquistão

189.000

510

4,9%

África do Sul

54.500

454

4,4%

Bangladesh

161.000

362

3,5%

Filipinas

101.000

324

3,1%

Congo

77.300

250

2,4%

10º

Mianmar

53.900

197

1,9%

11º

Etiópia

99.400

191

1,8%

12º

Tanzânia

53.500

164

1,6%

13º

Moçambique

28.000

154

1,5%

14º

Coréia do Norte

25.200

141

1,4%

15º

Vietnã

93.400

128

1,2%

16º

Tailândia

68.000

117

1,1%

17º

Rússia

143.000

115

1,1%

18º

Quênia

46.100

107

1,0%

19º

Angola

25.000

93

0,9%

20º

Brasil

208.000

84

0,8%

Número de casos nesses países

8.755

84,2%

Total global

10.400

100%

*Fonte: Global tuberculosis report 2016. World Health Organization. Dados organizados pelo CFM a partir das informações da Fig. 2.2 (pág. 12) e Tabela A4.1 (págs. 182-185)

 

Tratamento eficaz gera paradoxo

“Por exigir um tratamento longo, de no mínimo seis meses, a adesão é um fator determinante para o sucesso. Por ser muito e caz, o tratamento da tuberculose guarda esse paradoxo: o paciente em um a dois meses se sente melhor, acabam a febre e a tosse, ganha o peso que perdeu e se sente tentado a não tomar mais os medicamentos. Isso provoca a queda nas taxas de completude e de cura e, consequentemente, na recidiva da doença”, explica Margareth Dalcolmo.

De 2004 a 2014, o Brasil reduziu em 21,4% o coeficiente de mortalidade por tuberculose – passando de 2,8 para 2,2 por 100 mil habitantes. Os números são considerados positivos e geraram menção da OMS ao Brasil por ter atingido as três metas estabelecidas pelos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio de incidência, prevalência e mortalidade por tuberculose.

A despeito dos dados positivos, entre 2005 e 2014 ainda foi registrada uma média de 70 mil casos novos ao ano no Brasil. Entre 2012 e 2015, foram 4.400 mortes por tuberculose. O Ministério da Saúde admite que a proporção de cura pre cisa ser incrementada: foi de 74,2%, em 2014, e a OMS recomenda que o País alcance 85%. Outro ponto crítico é a taxa de abandono: a média nacional de 11%, em 2015, é bem acima do que a preconizado pela OMS (menor que 5%).

Ação institucional – Coordenador da Câmara Técnica do CFM sobre Tuberculose, Sidnei Ferreira identifica pontos críticos no combate à doença, como o abastecimento de medicamentos (como o etambutol e a terizidona) e de vacinas, além do alto risco de adoecimento de grupos vulneráveis, como indígenas, população carceráia e pessoas com HIV. Nesses segmentos, o risco chega a ser até 56 vezes maior que entre a população em geral.

O acesso à vacina também preocupa. A produção da BCG pela Fundação Ataulpho de Paiva (FAP) foi interditada, temporariamente, por inconformidade de boas práticas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no fim de 2016. No dia 23 de fevereiro, a comissão do CFM reuniu-se com o presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa Júnior, para informar as preocupações com o tema. “A situação é fora do normal, pois o estoque atualmente existente deve durar aproximadamente seis meses”, explica Clemax Sant’Anna, membro da Câmara do CFM.

População carcerária demanda atenção

A dificuldade de tratamento de pessoas com tuberculose que se encontram sob custódia do Estado nos presídios brasileiros é outro tema que recebe atenção da Câmara Técnica do CFM que se dedica a analisar esse problema. Segundo o Ministério da Saúde, os presos representam aproximadamente 0,3% da população brasileira e contribuem com 7,8% dos casos novos de tuberculose notificados no Pa?s: 5.367 registros, em 2014. Também particularmente elevada a frequência de formas resistentes relacionadas a tratamento irregular e detecção tardia nesse grupo populacional.

Na população carcerária, a amplificação da transmissão ocorre por conta de ambientes superlotados e mal ventilados e representa “risco não só para eles [os detentos] como para suas famílias, para os profissionais que exercem suas atividades nas prisões e para as comunidades onde as pessoas privadas de liberdade irão se inserir após o livramento”, explicam Alexandra Sánchez, da Fundação Oswaldo Cruz, e Bernard Larouzé, da Sorbonne Universités, em trabalho de 2016 sobre a experiência do Rio de Janeiro no controle da tuberculose nas prisões. Margareth Dalcolmo classifica o cenário atual como “uma catástrofe sanitária e uma flagrante violação dos mais elementares direitos à dignidade da pessoa”.

Entre as diversas medidas para sanar o problema, Sánchez e Larouzé apontam: melhorar as condições ambientais de encarceramento (condições de ventilação e iluminação natural, por exemplo), conter a superpopulação, resolver a restrição de acesso ao serviço de saúde e superar as más condições de trabalho dos profissionais de saúde.

O problema torna-se agudo na medida em que a população carcerária do Brasil é hoje a quarta maior do mundo, com 567.655 pessoas, e déficit de 210.436 vagas, segundo o diagnóstico do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre o tema, divulgado em 2014.

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