A terceira atividade do 3º Pré-Fórum Pró-Sus da Região Nordeste, realizado de 26 a 26 de agosto, em Salvador, foi a mesa redonda “SUS: financiamento, fontes de receitas e responsabilidades”. Os palestrantes foram o promotor público Rogério Luiz Gomes Queiroz; o corregedor do Conselho Regional de Medicina da Bahia, José Abelardo Meneses e conselheiro do Cremeb e membro da Comissão Nacional Pró-SUS Otávio Mangabeira.

O promotor Rogério Queiroz falou sobre o “Financiamento do SUS e responsabilidades da União, Estados e Municípios”, e fez um histórico da implantação do SUS a partir da 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986, até a emenda constitucional 86/15, que estabeleceu os gastos da União com saúde com base em percentuais da Receita Corrente Líquida. “A EC 86 era menos do que queríamos, mas era alguma garantia, só que está prestes a virar letra morta com a aprovação do teto dos gastos, que serão corrigidos apenas pela inflação”, lamentou.

Teto de gastos – “Será um retrocesso em relação ao que foi construído a partir de 1986, pois antes trabalhávamos com um mínimo a ser gasto em saúde, agora teremos um teto”, lamentou. O promotor entende que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada recentemente, é inconstitucional, pois como a Constituição fala em piso, a LDO, como lei hierarquicamente inferior, não poderia estabelecer um teto.

A complexidade do orçamento da saúde também foi questionada pelo promotor. “São mais de 130 ‘caixinhas’ onde são alocados os recursos da saúde no orçamento. É um sistema muito complexo, cruel com os gestores dos municípios menores, que têm de conhecer todos esses detalhes”, ponderou. Ele também criticou o fato de a União não incluir a obrigatoriedade de executar os serviços em saúde, ficando os municípios com as maiores responsabilidades. “O resultado é que paulatinamente a União vai diminuindo seus gastos em saúde: em 2000, ela era responsável por 60% dos gastos, passando para 44% em 2011.”

Rogério Queiroz também criticou as renúncias fiscais e desonerações, que aliviam a carga tributária das empresas, e a política dos juros altos. No orçamento de 2016, dos R$ 3 trilhões orçados, R$ 1,3 trilhão estão previstos para pagar o refinanciamento, juros e amortização e apenas R$ 100,4 bilhão para a saúde. “Isso mostra que a saúde não é prioridade no nosso país”, argumentou.

Falta de previsão – A palestra seguinte, do corregedor do Cremeb, José Abelardo Meneses, tratou do tema “Recursos do SUS: evolução das receitas e despesas federais e estaduais nos últimos anos e o cenário atual”. Para o palestrante, a raiz do problema do SUS é que a Constituição Federal previu o direito à saúde, mas esqueceu do financiamento. “O erro está no nascedouro, tanto é assim, que a regulamentação levou 24 anos para ser aprovada”, concluiu. Apesar de a Carta Magna prever um sistema universal, as famílias e empresas são responsáveis por 53% dos gastos em saúde.

Para Meneses, não dá para voltar ao tempo em que o sistema atendia quem tinha algum vínculo profissional, “mas não dá para um estrangeiro pisar no aeroporto hoje e ser atendido amanhã. Não é assim em lugar nenhuma do mundo”, defendeu. Ele também denunciou que, até 2011, o governo da Bahia aumentou a arrecadação, mas não aumentou os recursos para a saúde na mesma proporção. Além disso, tem entregado para as Organizações Sociais a administração hospitalar: atualmente, 45% da rede estadual é terceirizada. “E desses hospitais, apenas dois estão indo bem. Até porque o governo atrasa pagamentos e o controle não é efetivo”, denunciou.

Além do desfinanciamento, Meneses acusa a desprofissionalização do SUS como causa para a situação atual. “Não temos gestores para mais de 5.400 municípios, que saibam onde alocar recursos nas mais de 130 ‘caixinhas’ do orçamento. E ainda temos quem usa o parco orçamento para benefício próprio”, lamentou. O controle social também é um engodo, já que as pessoas participam dos conselhos para ser a favor ou contra o governo.

Planos populares – A última palestra do dia, de Otávio Marambaia, tratou do tema “Plano de saúde acessível. Para desafogar o SUS?”, em que ele fez uma crítica à recente proposta do ministro da saúde, Ricardo Barros. “Em nota pública, divulgada pelo CFM no mesmo dia em que foi editada a portaria criando o grupo de trabalho que vai estudar a criação desses planos, a nossa autarquia foi clara ao mostrar que os ganhadores serão os operadores”, denunciou.

Marambaia mostrou que, em 2015, o sistema de saúde suplementar teve um faturamento de R$ 180 bilhões para atender 50 milhões de pessoas. Já o SUS, para o mesmo período, teve um orçamento de R$ 50 milhões para 150 milhões de vida. Ele também fez uma estimativa de quanto seria o faturamento das operadoras caso 50 milhões de pessoas, hoje sem planos de saúde, aderissem. Com uma mensalidade de R$ 25, o faturamento anual seria de R$ 15 bilhões, que dobraria caso a valor mensal fosse R$ 50,00. “E quem vai fiscalizar a qualidade desses planos. A Agência Nacional de Saúde Suplementar, que hoje já não fiscaliza os planos atuais?”, questionou.

A esperança de Marambaia é que os planos populares não passem de factoides. “E se forem autorizados a funcionar, vão lesar o cidadão, aumentar as demandas judiciais e não resolverão os problemas do SUS”, vaticinou. Ao final da sua fala, Marambaia classificou o SUS a uma moça bonita, com um dote considerável, mas que ninguém quer casar. “Todos elogiam, mas nenhum governo se compromete realmente”, afirmou.

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