Por mais de duas horas, os participantes do I ENCM 2016 acompanharam palestras e debates que analisaram o futuro da medicina na América Latina. Para o coordenador da mesa, Jeancarlo Fernandes Cavalcante, conselheiro federal pelo Rio Grande do Norte e 1º vice-presidente da Confederação Médica Latino-Americana e do Caribe (Confemel), o plenário lotado ate o final demonstrou a relevância da temática.

“Temos necessidade de saber como funcionam os sistemas de saúde em outros países; como cada um está gerindo esses modelos; e as experiências podem ser replicadas em outros locais. Oportunidades como está nos permitem a troca de informações. Também são momentos para relatarmos nossos problemas, que ao final descobrimos serem quase os mesmos”, concluiu Jeancarlo Cavalcante.

O coordenador informou ainda que o CFM tem se preocupado em buscar integração com entidades dos demais países da América Latina. “Em julho vamos fazer um fórum sobre a Medicina de Fronteiras. É um assunto que interessa a todos, até porque um falso médico que começa a trabalhar no Brasil num estado de fronteira, posteriormente vai para outros centros. É um problema que afeta todos os médicos brasileiros”, ponderou.

Falta de harmonia – Durante as exposições o secretário-geral da Confemel, o uruguaio Gerardo Eguren, explicou divisão dos sistemas de saúde entre públicos e privados, que, segundo pontuou, nem sempre convivem de forma harmoniosa. “Também encontramos grande segmentação, o que gera ineficiência e aumento de custos. Sem esta interconectividade, estaremos fazendo esforços além do necessário”, opinou.

Como forma de melhorar o acesso da população à medicina diagnóstica, Eguren sugeriu o uso da telemedicina, com médicos do interior podendo intercambiar com profissionais na capital, que ajudaria na definição de diagnósticos. Ele defendeu ainda uma maior integração entre os sistemas de saúde da América Latina e disse que nos países pequenos, como o Uruguai, não é possível alcançar o grau de resolubilidade do Brasil.

“Na medicina temos uma curva de aprendizagem. Quanto mais pacientes atendemos, mais aprendemos. No Uruguai, não temos tantos pacientes e vários uruguaios fazem tratamento em São Paulo”, informou. Ele ainda criticou as tomadas de decisões feitas com base na pressão da imprensa: “Temos 17 casos de dengue confirmados no Uruguai, mas como a mídia tem dado muita publicidade e o caso se tornou a preocupação número um em saúde”, ressaltou.

O representante da Confemel relatou ainda que, como ocorreu no Brasil, os médicos cubanos também foram contratados para trabalhar no Uruguai sem que seus diplomas fossem revalidados. Além dos nativos cubanos, foram paquistaneses formados em Cuba. “Se eles não falam bem o espanhol, como vão se comunicar com os pacientes? ”, questionou.

SUS colombiano – O vice-presidente da Federação Médica da Colômbia, César Augusto Prieto Ávila, apresentou detalhes sobre o sistema de saúde do país, implantado a partir da lei 1.751/15. A proposta trouxe o paradigma da saúde como um direito fundamental do cidadão em detrimento da visão anterior, que vigorou de 1993 até o ano passado, que se baseava numa lógica privada, dando acesso ao atendimento de forma escalonada, conforme a capacidade de pagamento dos cidadãos.

Os que não podiam pagar e acessavam os serviços pelas urgências e emergências. A parcela com recursos limitados contava com subsídios que davam direito a um pacote limitado de cobertura. O grupo de maior renda tinha uma cesta mais ampla. Nos três casos, para a utilização de alguns serviços e aquisição de determinados medicamentos e insumos, era necessário algum desembolso por parte do paciente.

“No plano teórico, 65% da população ficaria no plano contributivo, 35% no subsidiado e o restante era residual. Ano passado, esses percentuais estavam em 32%, 58% e 10%, respectivamente. Quem estava na última categoria, praticamente não recebia atendimento. Estava fadado aos ‘passeios da morte’, em que, doentes, ficavam indo de hospital a hospital e nenhum o aceitava, pois não tinha quem pagasse a conta, até morrer ”, contou César Ávila.

O atendimento à população era feito pelas Empresas Promotoras de Saúde (EPS), instituições privadas “que gastavam pouco para dar um bom rendimento”. Outra consequência do modelo era a inexistência de medicina preventiva na Colômbia, com foco na ações curativas e intra-hospitalares.

O resultado da adoção desse modelo foi a piora dos índices epidemiológicos, que em alguns casos estão piores do que em 1993, ano de sua implantação. A taxa de mortalidade materna, por exemplo, era de 70 a cada 100 mil crianças nascidas vivas, maior que em alguns países africanos. Na avaliação de Ávila, os médicos também sofreram com antigo modelo. Perderam a estabilidade laboral e a autonomia, pois só podiam indicar tratamentos pré-estabelecidos. Também tiveram redução salarial.

Violência contra médicos – Outro tema abordado na rodada sobre o futuro da medicina na América Latina foi o aumento do número de casos de violência e agressões contra médicos. O secretário-geral da Confemel, Gerardo Eguren, alertou para o fenômeno. Segundo relatou, pesquisa realizada entre os médicos uruguaios constatou que as maiores vítimas são mulheres (77%) e que quase 80% dos médicos conhecem algum colega que foi agredido.

Os dados apontam que a maioria das agressões são verbais (95%), mas 10% dos médicos entrevistados foram agredidos fisicamente e 47%, psicologicamente. Os abusos ocorrem, em sua maioria, contra médicos jovens e ocorrem, principalmente, em salas de emergência (56,7%), consultórios (49,7%) e hospitais (33,1%).

Para dar suporte aos agredidos, o sindicato dos médicos do Uruguai oferece um serviço de 0800, que dá orientações às vitimas. Os profissionais são instruídos a também prestarem denúncia policial.

Como nota triste e que configura um tipo de violência contra os médicos no continente, a organização do I ENCM informou que o evento contaria com a participação do presidente do Colégio Médico de El Salvador, Juan Antonio Tobar Rivas, que foi impedido de sair do país pelo governo salvadorenho.

Rivas é cirurgião e tem denunciado as mazelas do País na área de saúde. “A Confemel vai se posicionar contra esta ação do governo de El Salvador, repudiando este atentado contra a liberdade de expressão”, afirmou Jeancarlo Cavalcante, 1º vice-presidente da entidade e conselheiro federal de medicina.

 

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