Reproducao video Detran – 21/7/08

Os riscos de falar ao celular são alvo de estudos divergentes há anos, mas o posicionamento da OMS aumenta a preocupação sobre danos a longo prazo

 

Depois de revisar centenas de estudos sobre o potencial carcinogênico da radiação emitida pelos telefones móveis, entidade emite comunicado definindo os aparelhos sem fio como arriscados

“O Ministério da Saúde adverte: esse produto causa câncer.”A frase, que estampa as carteiras de cigarro em diversos países do mundo, inclusive no Brasil, poderá, um dia, constar nas caixas de aparelhos celulares. Desde que esses telefones se tornaram populares, na década de 1990, vários estudos divergem entre associar a radiação emitida por radiofrequência ao surgimento de tumores e negar qualquer problema do tipo. Agora, a Organização Mundial de Saúde (OMS) entrou na briga e lançou um comunicado no qual estabelece os celulares como possível agente cancerígeno em humanos.

A inclusão do celular no grupo 2B (veja quadro) foi decidida depois de uma reunião da Agência Internacional para Pesquisa do Câncer, órgão da OMS, encerrada ontem. Trinta e um cientistas se encontraram em Lyon, na França, e formaram um grupo de trabalho para discutir o potencial cancerígeno de aparelhos sem fio, que emitem radiação por radiofrequência. Depois de analisar o resultado de centenas de estudos, eles decidiram que “pode haver algum risco e, por isso, precisamos vigiar de perto a ligação entre celulares e câncer”, segundo o comunicado divulgado à imprensa.

O alerta, por enquanto, refere-se a tumores malignos de cérebro e do nervo auditivo. Os cientistas consideraram que seria inadequado ampliar as conclusões para outros tipos de cânceres. “O grupo de trabalho não quantificou o risco, mas um estudo sobre o uso de celular no passado (até 2004) mostrou um aumento de 40% no risco para glioma (câncer no cérebro) nos usuários “pesados”, que usaram o aparelho mais de 30 minutos por dia ao longo de 10 anos”, diz o comunicado.

O documento significa uma mudança na postura da OMS, que, até o ano passado, considerava que não havia evidências para vincular o uso de celular ao risco de câncer. Em um comunicado de maio de 2010, a organização afirmou que “até agora, nenhum efeito adverso à saúde foi associado ao telefone celular”. Também alertou, contudo, que estudos estavam sendo feitos para verificar o potencial maléfico do uso do aparelho e que, devido ao grande número de usuários – 5 bilhões, sendo 94 milhões no Brasil -, era “importante investigar, entender e monitorar qualquer impacto em potencial à saúde pública”.

A comunicação por aparelho celular se dá pela transmissão de ondas de rádio por meio de uma rede de antenas. Os telefones operam em frequências entre 450 e 2,7 mil megahertz, com picos que variam entre 0,1 e 2 watts de potência. Como comparação, os microfones profissionais sem fio emitem ondas entre 174 e 216 megahertz. A energia só é transmitida quando o aparelho está ligado e, ao se afastar do equipamento, o usuário diminui instantaneamente a exposição. A radiação eletromagnética é diferente daquela emitida pelos raios X, portanto, não bombardeia o organismo com íons – mas aquece os tecidos do corpo.

Uma pessoa que opera o celular entre 30cm e 40cm distante da cabeça – por exemplo, digitando uma mensagem de texto, acessando a internet ou ativando o modo alto-falante – ficará, consequentemente, menos exposta ao campo magnético que aquela que usa o celular posicionado diretamente no ouvido. Uma forma de se proteger, de acordo com a OMS, é limitar o número e a duração das chamadas. O uso do telefone em áreas com boa recepção também diminui a exposição, mas equipamentos desenhados para diminuir a exposição à radiofrequência, como os fones de ouvido, não se mostraram efetivos ainda.

Em nota à imprensa, os fabricantes de celular responderam à avaliação da Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer (Iarc). “A Iarc apenas concluiu que ainda há a possibilidade de que os campos de radiofrequência sejam carcinogênicos e identificou áreas para pesquisas adicionais. A Iarc avaliou apenas a possibilidade de risco, e não o risco real em uso normal. Essa avaliação agora será considerada pelas autoridades de saúde, que vão determinar o seu impacto em geral”, disse Michael Milligan, secretário-geral do Mobile Manufacturers Forum (MMF). Ele também afirmou que, “além de operar dentro de limites de exposição, os telefones celulares são desenvolvidos para garantir que estejam sempre operando no nível mínimo para fazer uma chamada telefônica de qualidade”.

De acordo com Nora D. Volkow, pesquisadora dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos em Bethesda, o aumento do uso dos aparelhos celulares tem preocupado os cientistas a respeito dos efeitos maléficos da exposição a campos eletromagnéticos de radiofrequência modulada. Ela é a principal autora de um estudo publicado em fevereiro no jornal da Academia Médica Americana, que investigou os efeitos dessa radiação no cérebro. Volkow diz que uma pesquisa preliminar mostrou que o uso do aparelho por 50 minutos está associado a uma modificação na atividade cerebral.

Embora a médica afirme que a literatura que vincula o celular ao risco de câncer no órgão seja inconsistente, ela diz que há evidências de que o cérebro é sensível aos efeitos da radiofrequência resultante da exposição ao celular. “O metabolismo em uma área próxima à antena do celular, o córtex orbitofrontal, foi significativamente maior em pessoas que usam o aparelho por tempo prolongado”, disse a especialista ao Correio. “Embora nosso resultado não tenha evidenciado diretamente o potencial carcinogênico do celular, mais estudos epidemiológicos de longo prazo podem comprovar essa associação.”

A questão, reconhece Volkow, continua polêmica, apesar do aviso da OMS. Cinco dias antes de a cientista publicar seu estudo, uma outra pesquisa, da Universidade de Manchester, negou que o aparelho celular cause efeitos no cérebro, especificamente, no caso do câncer. Com base em estatísticas do órgão oficial de saúde da Inglaterra, os cientistas analisaram a incidência de novos casos de câncer cerebral no país entre 1998 e 2007. Publicado no jornal especializado Bioelectromagnetics, o artigo mostrou que não havia mudanças significativas na incidência desse tipo de tumor durante os nove anos de observações.

Frank de Vocht, especialista em saúde ocupacional e ambiental e principal autor do estudo, conta ao Correio que, enquanto no período estudado o uso de celular passou de 0% (sem estatística significativa) para 65%, os casos de câncer no lobo temporal tiveram um aumento mínimo, de 0,6 caso em cada 100 mil habitantes, ou 31 diagnósticos novos por ano em uma população de 52 milhões, o que seria muito pouco.

Sem pânico

A chefe da área de câncer ocupacional e ambiental do Instituto Nacional do Câncer (Inca), Ubirani Otero, diz que o comunicado da OMS não deve ser motivo de pânico, mas serve como um alerta para evitar possíveis abusos no uso do equipamento. “É um avanço da OMS, embora o fato de esse tipo de radiação ter sido classificado no grupo 2B signifique que há uma possibilidade de causar câncer, e não de que reconhecidamente cause câncer”, explica. “Mas é um alerta importante, principalmente no Brasil, um dos poucos países onde não há orientação sobre os riscos da radiação por radiofrequência”, afirma.

De acordo com ela, como não há comprovação entre o uso de celular e o risco de câncer cerebral, também é impossível definir um “uso seguro”. Isso não impede, porém, que as pessoas procurem restringir a exposição ao mínimo necessário. “As crianças e os adolescentes ficam pendurados no telefone, é preciso minimizar a exposição. Além do câncer, a radiação pode causar outros efeitos no cérebro, como diminuição da memória e da concentração”, diz. Lembrando que os tumores malignos não surgem da noite para o dia, mas se desenvolvem lentamente, a médica ressalta a importância de se “trabalhar hoje para evitar risco futuro”. “O celular garantiu aos pobres e ricos o acesso à informação e isso é uma coisa importantíssima. Então, não é preciso pânico, mas temos de reconhecer que pode haver riscos. Por isso, recomendo parcimônia no uso.”

Classificação do perigo

A Organização Mundial de Saúde define os agentes carcinogênicos em grupos e subgrupos:

Grupo 1

O agente é carcinogênico em humanos. Isso significa que há provas suficientes para classificá-lo desse modo. Inclui-se na categoria o cigarro.

Grupo 2

Baseia-se em graus de evidência e se divide em 2A e 2B. No primeiro caso, há provas limitadas do potencial cancerígeno em humanos e provas suficientes em animais. No segundo caso, em que se inclui agora a radiofrequência emitida por celular, há provas limitadas em humanos e poucas em animais.

Grupo 3

As evidências são muito fracas em humanos e limitadas em experimentos animais, exigindo-se mais pesquisas.

Grupo 4

Há provas consistentes de que o agente não é carcinogênico.

 

Fonte: Paloma Oliveto – Ministério da Saúde


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