Se aprovada, a regulamentação da Emenda 29, que institui verba mínima obrigatória para a saúde de 15% do orçamento em municípios e 12% em estados, gerará mais gastos para o governo. Em vigor desde 2000, a medida nunca foi regulamentada, de forma que os recursos acabam desviados para outros setores.

O projeto de lei do senador Tião Viana (PT) propõe que dispositivos que permitem utilizar dinheiro para outras atividades sejam esclarecidos. Para isso, será necessário reconduzir parte da verba para tapar o buraco de despesas antes cobertas pela porcentagem da saúde. A proposta será votada no dia 28 de setembro. A presidenta Dilma manifestou que “não quer presente de grego”, ou seja: se aprovado o projeto, será necessário encontrar novas formas de financiar gastos.

Divisão dos royalties do petróleo, regularização e taxação de bingos e, a mais polêmica, a volta de um tributo sobre transação financeira, a Contribuição Social para a Saúde, já apelidada da “nova CPMF”, são as opções aventadas pelos governantes para implementar a arrecadação.

A Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta em 2007, tributava as operações bancárias, sem restrições de quantidade ou renda. A alíquota de 0,38% poderia chegar a valores muito maiores – 3 ou até 5% por se tratar de uma tributação cumulativa, ou seja, aplicada a todas as etapas do processo produtivo.

A tributação era, desde seu surgimento, em 1994, vinculada à saúde. Tudo que fosse arrecadado era direcionada à área, em uma tentativa de solucionar o sistema público no país. Em 2000, no entanto, com a aprovação da Emenda 29 e o estabelecimento de porcentagens mínimas do orçamento para a área, essa obrigação se encerrou. É importante destacar que, desde seu surgimento, 20% da CPMF poderia ser utilizado em outros gastos.

A CPMF foi o cavalo de batalha da oposição petista durante os anos de FHC. O presidente Lula subiu ao poder e estendeu por mais 5 anos o tributo. A arrecadação da CPMF, em 2007, foi de 36,5 bilhões de reais, o que corresponde a 6% do total de impostos e contribuições daquele ano, de cerca de mais de 600 bilhões de reais.

Nas últimas semanas, o debate sobre o financiamento à saúde ocupou a mídia. Dilma Roussef parece certa em instituir o CCS. Se a “nova CPMF” realmente for implementada, é o povo brasileiro e, sobretudo, as classes mais baixas que serão prejudicadas.

Dilma Roussef justifica que a CPMF foi impopular porque o dinheiro acabou sendo utilizado para outros setores. “Acho errada a CPMF, porque foram lá, aprovaram e destinaram o recurso para saúde? Não. O povo brasileiro tem essa bronca da CPMF porque disseram que era para saúde e não foi. Agora, ninguém vai fazer a mágica de dizer que a saúde vai melhorar se não tiver mais investimentos e tem que dizer de onde sai [o investimento]”, destacou. “Não sou a favor daquela CPMF porque ela foi desviada”, acrescentou.

Mas, para João Eloi Olenike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), uma nova tributação é desnecessária para financiar a saúde. Nos últimos anos, o Brasil tem batidos recordes subsequentes de arrecadação. O impostômetro mostra que o governo já coletou quase 992 bilhões de reais somente em 2011 – até o fim do ano, estima-se que o total chegue a um trilhão. Uma pesquisa feita pelo IBPT mostra que a arrecadação cresceu 17,22% no primeiro semestre de 2011 em relação ao mesmo período do ano anterior. “O governo não tem mais CPMF desde 2008 e continua tendo recordes, o que mostra que a CMPF era dispensável”, afirma o pesquisador.

Para o advogado tributário e docente da faculdade de direito da USP, Heleno Taveira Torres, a criação da CPMF em 1994 fazia sentido diante dos problemas decorrentes da contenção da inflação no período. “A continuidade da CPMF foi reconhecida como necessária porque a arrecadação não era suficiente”, diz ele. O que difere do cenário atual.

Olenike explica que o dinheiro existe, mas está mal administrado. “Esse excesso de arrecadação, para onde vai? É isso que a Dilma deve explicar”, diz Olenike. Para Torres, criar uma nova contribuição representa a má vontade dos governantes de abrir mão de receita. Segundo ele, a CPMF falhou porque o dinheiro foi mal distribuído. “Os hospitais continuaram a míngua. Havia muitas falhas na administração desse recurso: apesar de dizer que era para a saúde, a saúde nunca foi tão mal financiada quanto no período”. Torres enxerga que o momento não poderia ser pior para criar um novo imposto – com a base aliada desgastada pelos escândalos – a presidenta não pode se dar ao luxo de perder apoio popular.

“A presidente Dilma se elegeu com um discurso de realizar uma ampla reforma tributária e não criar mais impostos”, afirma Torres, que explica que a CPMF foi extinta com mais de 2/3 dos votos. A reforma tributária, segundo ele, é promessa há quatro gestões, mas nunca foi realizada.

No Brasil, os gastos das empresas com a tributação são revertidos para o consumidor quase integralmente. “Hoje, 40 a 60% do preço dos produtos é imposto ou contribuição”, afirma Torres. “A tributação está baseada no consumo e não na renda”. A reforma tributária serviria para justamente, equalizar a conta e cobrar mais de quem tem menos.

Fonte: Carta Capital Online

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